Já passou da hora do Brasil deixar de ser o país do jeitinho, que evolui para a corrupção, para a troca de favores e para a prática de vários crimes.
Eis algumas partes do voto colossal de Celso de Mello:
"
(…)
Entendo que o Ministério Público expôs na peça acusatória eventos delituosos revestidos de extrema gravidade e imputou aos réus ora em julgamento ações moralmente inescrupulosas e penalmente ilícitas que culminaram, a partir de um projeto criminoso por eles concebido e executado, em verdadeiro assalto à Administração Pública, com graves e irreversíveis danos ao princípio ético-jurídico da probidade administrativa e com sério comprometimento da dignidade da função pública, além de lesão a valores outros, como a integridade do sistema financeiro nacional, a paz pública, a credibilidade e a estabilidade da ordem econômico-financeira do País, postos sob a imediata tutela jurídica do ordenamento penal.
(…)
Quero registrar, neste ponto, Senhor Presidente, tal como salientei em voto anteriormente proferido neste Egrégio Plenário, que o ato de corrupção constitui um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper.
Entendo que o Ministério Público expôs na peça acusatória eventos delituosos revestidos de extrema gravidade e imputou aos réus ora em julgamento ações moralmente inescrupulosas e penalmente ilícitas que culminaram, a partir de um projeto criminoso por eles concebido e executado, em verdadeiro assalto à Administração Pública, com graves e irreversíveis danos ao princípio ético-jurídico da probidade administrativa e com sério comprometimento da dignidade da função pública, além de lesão a valores outros, como a integridade do sistema financeiro nacional, a paz pública, a credibilidade e a estabilidade da ordem econômico-financeira do País, postos sob a imediata tutela jurídica do ordenamento penal.
(…)
Quero registrar, neste ponto, Senhor Presidente, tal como salientei em voto anteriormente proferido neste Egrégio Plenário, que o ato de corrupção constitui um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper.
Quem
transgride tais mandamentos, não importando a sua posição estamental,
se patrícios ou plebeus, governantes ou governados, expõe-se à
severidade das leis penais e, por tais atos, o corruptor e o corrupto
devem ser punidos, exemplarmente, na forma da lei.
Este
processo criminal revela a face sombria daqueles que, no controle do
aparelho de Estado, transformaram a cultura da transgressão em prática
ordinária e desonesta de poder, como se o exercício das instituições da República pudesse ser degradado a uma função de mera satisfação instrumental de interesses governamentais e de desígnios pessoais.
Fácil
constatar, portanto, considerados os diversos elementos legitimamente
produzidos nestes autos e claramente demonstrados pelo eminente
Relator, que a conduta dos réus, notadamente daqueles que
ostentam ou ostentaram funções de governo, não importando se no Poder
Legislativo ou no Poder Executivo, maculou o próprio espírito
republicano.
Em
assuntos de Estado e de Governo, nem o cinismo, nem o pragmatismo,
nem a ausência de senso ético, nem o oportunismo podem justificar,
quer juridicamente, quer moralmente, quer institucionalmente,
práticas criminosas, como a corrupção parlamentar ou as ações
corruptivas de altos dirigentes do Poder Executivo ou de agremiações
partidárias.
Extremamente
precisa a observação, sempre erudita, do Professor Celso Lafer,
quando, ao discorrer sobre o espírito republicano, acentua, a partir de
Montesquieu, que “o princípio que explica a dinâmica de uma República, ou seja, o sentimento que a faz durar e prosperar, é a virtude.
É nesse contexto que se pode dizer que a motivação ética é de natureza
republicana. Isso passa (…) pela virtude civil do desejo de viver com
dignidade e pressupõe que ninguém poderá viver com dignidade numa
comunidade política corrompida”.
(…)
É por isso, Senhores Ministros, que a concepção republicana de poder mostra-se absolutamente incompatível com qualquer prática governamental tendente a restaurar a inaceitável teoria do Estado patrimonial.
É por isso, Senhores Ministros, que a concepção republicana de poder mostra-se absolutamente incompatível com qualquer prática governamental tendente a restaurar a inaceitável teoria do Estado patrimonial.
Com o
objetivo de proteger valores fundamentais, Senhor Presidente, tais
como se qualificam aqueles consagrados nos princípios da transparência,
da igualdade, da moralidade e da impessoalidade, o sistema
constitucional instituiu normas e estabeleceu diretrizes destinadas a
obstar práticas que culminem por patrimonializar o poder governamental,
convertendo-o, em razão de uma inadmissível inversão dos postulados
republicanos, em verdadeira “res domestica”, degradando-o, assim, à
condição subalterna de instrumento de mera dominação do Estado,
vocacionado, não a servir ao interesse público e ao bem comum, mas,
antes, a atuar como incompreensível e inaceitável meio de satisfazer
conveniências pessoais e de realizar aspirações governamentais e partidárias.
(…)
O fato é um só, Senhor Presidente: quem tem o poder e a força do Estado, em suas mãos, não tem o direito de exercer, em seu próprio benefício, a autoridade que lhe é conferida pelas leis da República. A gravidade da corrupção governamental, inclusive aquela praticada no Parlamento da República, evidencia-se pelas múltiplas consequências que dela decorrem, tanto aquelas que se projetam no plano da criminalidade oficial quanto as que se revelam na esfera civil (afinal, o ato de corrupção traduz um gesto de improbidade administrativa) e, também, no âmbito político-institucional, na medida em que a percepção de vantagens indevidas representa um ilícito constitucional, pois, segundo prescreve o art. 55, § 1º, da Constituição, a percepção de vantagens indevidas revela um ato atentatório ao decoro parlamentar, apto, por si só, a legitimar a perda do mandato legislativo, independentemente de prévia condenação criminal.
(…)
O fato é um só, Senhor Presidente: quem tem o poder e a força do Estado, em suas mãos, não tem o direito de exercer, em seu próprio benefício, a autoridade que lhe é conferida pelas leis da República. A gravidade da corrupção governamental, inclusive aquela praticada no Parlamento da República, evidencia-se pelas múltiplas consequências que dela decorrem, tanto aquelas que se projetam no plano da criminalidade oficial quanto as que se revelam na esfera civil (afinal, o ato de corrupção traduz um gesto de improbidade administrativa) e, também, no âmbito político-institucional, na medida em que a percepção de vantagens indevidas representa um ilícito constitucional, pois, segundo prescreve o art. 55, § 1º, da Constituição, a percepção de vantagens indevidas revela um ato atentatório ao decoro parlamentar, apto, por si só, a legitimar a perda do mandato legislativo, independentemente de prévia condenação criminal.
A
ordem jurídica, Senhor Presidente, não pode permanecer indiferente a
condutas de membros do Congresso Nacional – ou de quaisquer outras
autoridades da República – que hajam eventualmente incidido em
censuráveis desvios éticos e reprováveis transgressões criminosas, no desempenho da elevada função de representação política do Povo brasileiro.
Sabemos
todos que o cidadão tem o direito de exigir que o Estado seja dirigido
por administradores íntegros, por legisladores probos e por juízes
incorruptíveis. O direito ao governo honesto – nunca é demasiado
reconhecê-lo – traduz uma prerrogativa insuprimível da cidadania.
A
imputação, a qualquer membro do Congresso Nacional, de atos que
importem em transgressão ao decoro parlamentar revela-se fato que
assume, perante o corpo de cidadãos, a maior gravidade, a exigir, por
isso mesmo, por efeito de imposição ética emanada de um dos dogmas
essenciais da República, a repulsa por parte do Estado, tanto mais se se
considerar que o Parlamento recebeu, dos cidadãos, não só o
poder de representação política e a competência para legislar, mas,
também, o mandato para fiscalizar os órgãos e agentes dos demais Poderes.
Vê-se,
nesse ponto, a íntima correlação entre a própria Constituição da
República, em face de que prescreve o seu art. 55, § 1º, e a legislação
penal. Qualquer ato de ofensa ao decoro parlamentar, como a
aceitação criminosa de suborno, culmina por atingir, injustamente, a
própria respeitabilidade institucional do Poder Legislativo, residindo,
nesse ponto, a legitimidade ético-jurídica do procedimento
constitucional de cassação do mandato parlamentar, em ordem a excluir,
da comunhão dos legisladores, aquele – qualquer que seja – que se haja
mostrado indigno do desempenho da magna função de representar o Povo,
de formular a legislação da República e de controlar as instâncias
governamentais do poder.
(…)
Importante
destacar, Senhor Presidente, as gravíssimas consequências que
resultam do ato indigno (e criminoso) do parlamentar que
comprovadamente vende o seu voto e que também comercializa a sua
atuação legislativa em troca de dinheiro ou de outras indevidas
vantagens.
(…)
A
corrupção deforma o sentido republicano de prática política, compromete a
integridade dos valores que informam e dão significado à própria ideia
de República, frustra a consolidação das instituições, compromete a
execução de políticas públicas em áreas sensíveis como as da saúde, da
educação, da segurança pública e do próprio desenvolvimento do País,
além de afetar o próprio princípio democrático.
Daí os
importantes compromissos internacionais que o Brasil assumiu em
relação ao combate à corrupção, como o evidencia a subscrição, por
nosso País, da Convenção Interamericana contra a Corrupção (celebrada na
Venezuela em 1996) e da Convenção das Nações Unidas (celebrada em
Mérida, no México, em 2003).
As razões
determinantes da celebração dessas convenções internacionais (uma, de
caráter regional, e outra, de projeção global) residem,
basicamente, na preocupação da comunidade internacional com a extrema
gravidade dos problemas e das consequências nocivas decorrentes da
corrupção para a estabilidade e a segurança da sociedade, eis que essa
prática criminosa enfraquece as instituições e os valores da democracia,
da ética e da justiça, além de comprometer a própria sustentabilidade
do Estado democrático de direito, considerados os vínculos entre a
corrupção e outras modalidades de delinquência, com particular
referência para a criminalidade organizada, a delinquência governamental
e a lavagem de dinheiro.
(…)
Esses
vergonhosos atos de corrupção parlamentar, profundamente lesivos à
dignidade do ofício legislativo e à respeitabilidade do Congresso
Nacional, alimentados por transações obscuras idealizadas e
implementadas em altas esferas governamentais, com o objetivo de fortalecer a base de apoio político e de sustentação legislativa no Parlamento brasileiro, devem
ser condenados e punidos com o peso e o rigor das leis desta República,
porque significam tentativa imoral e ilícita de manipular,
criminosamente, à margem do sistema constitucional, o processo
democrático, comprometendo-lhe a integridade, conspurcando-lhe a
pureza e suprimindo-lhe os índices essenciais de legitimidade,
que representam atributos necessários para justificar a prática honesta
e o exercício regular do poder aos olhos dos cidadãos desta Nação.
Esse
quadro de anomalia, Senhor Presidente, revela as gravíssimas
consequências que derivam dessa aliança profana, desse gesto infiel e
indigno de agentes corruptores, públicos e privados, e de parlamentares
corruptos, em comportamentos criminosos, devidamente comprovados, que
só fazem desqualificar e desautorizar, perante as leis criminais do
País, a atuação desses marginais do Poder. "
Nenhum comentário:
Postar um comentário